terça-feira, 28 de abril de 2015

Contos & Crônicas: A conversa

Andava pela rua quando o sol saiu secando as últimas gotas de chuva. Ela levantou a cabeça e olhou as nuvens se dissiparem no céu. Um cachorro vagabundo se sacudiu para se secar e acabou molhando-a. Praguejou e continuou seu caminho.

Agora restavam somente alguns metros até a casa dele. Já podia ver o contorno do prédio no fim da rua. Seu coração acelerou. Nunca antes havia feito aquilo. Mas agora havia uma urgência, uma necessidade. Era preciso que ele ouvisse o que tinha a dizer.

Chegou ao prédio e parou à porta. Os batimentos de seu coração aumentavam a cada segundo. Fechou os olhos tentando se acalmar. Reorganizou os pensamentos e repassou mais uma vez a frase que ensaiou a semana inteira em frente ao espelho. Quando se sentiu confiante, tocou o interfone:

- Pronto.

- Roberto?

- Quem é?

- Mariana...

- Oi, Mari. Sobe aí!

A portaria abriu e ela entrou. Resmungou mal humorada quando descobriu que teria que subir até o quinto andar de escada: o elevador estava quebrado.

Subiu os dois primeiros andares e a respiração acelerou. E se ele não respondesse às expectativas do que tinha a dizer? Não tinha pensado nisso ainda. Seu coração se encheu de dúvidas. E se tudo desse errado? Meu Deus! O que ela faria? Agora já era tarde demais para pensar nisso. Estava a apenas três andares dele. Era agora ou nunca. Venceu os degraus restantes.

Quando chegou em frente ao apartamento dele, tocou a campainha.

- Oi, Mari! Como você está? – Deu um beijo no rosto dela e abriu espaço para que entrasse. – Aceita uma água?

Ela fez que “sim” com a cabeça e sentou-se no sofá. Em pouco tempo havia um copo de água em sua mão, ainda intocado. Estava dispersa. Seus olhos vagavam entre os móveis, o copo e o rosto dele.

Demorou vários minutos até perceber que Roberto estava falando. E muito. A boca não parava de despejar um mar de palavras sem fim que começaram a desnorteá-la. Quando não aguentou mais, interrompeu-o com desculpa de ir ao banheiro.

Sozinha, lavou a nuca e o rosto na pia. Olhou-se no espelho. Era a própria visão do desespero. Só de lembrar-se do que fora fazer ali revirava seu estômago. Tentou se acalmar o máximo que pôde e voltou para a sala.

Roberto sorriu e Mariana sentiu-se derreter por dentro. Medo. Ansiedade. Vergonha. Eram tantos os sentimentos que a inundavam agora que não saberia descrevê-los. Por fim, reuniu toda a coragem que lhe restava.

- Preciso te falar uma coisa.

- Fique à vontade! Você sabe que o que precisar é só falar. Pode se abrir comigo. Sou seu amigo. Estou aqui para o que der e vier.

Ela se irritou.

- Cala a merda da boca só por um segundo!

- O que foi, Mari? Por que você está nervosa? Sou seu amigo! Pode confiar em mim.
Deus, o sorriso dele era perfeito.

- Só escute o que eu tenho para falar.

- Mas se você tem alguma coisa para falar, diga logo! Nunca impedi ninguém de falar nada. 

- A irritação dela crescia. – Além do mais, entre amigos não deve haver segredos. Vamos, diga! O que é?

Nervosa, coração palpitando, boca seca. Fechou os olhos e disse em voz mais alta do que gostaria:


- Vim cobrar os R$ 200 que você está me devendo.

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